segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

II



15 dias antes do solstício de verão 1556 d.K.
            Chovia bastante na fazenda de Brodden, que já estava preocupado com a imensa quantidade de água que caíra e caía sobre sua plantação. Foi nesse momento, no entanto, que sua situação, a priori ruim, piorou.
            Sendo puxada por dois cavalos guiados por dois homens altos e magros, apareceu no horizonte, se aproximando aos poucos, uma carruagem vermelha muito bem adornada. Os dois homens eram os famosos denniars, soldados reais que utilizavam túnicas de cor vermelha com um traço branco que ia do ombro direito até a parte esquerda da cintura, usavam seus tradicionais capacetes cônicos, que cobria o nariz (possuíam um anasal prolongado) e toda a cabeça, com exceção da região das narinas, da boca e do queixo. No topo da carruagem, tremulando, a bandeira de Terra per Timorem, em um fundo vermelho com uma listra branca que vai o canto superior direito até o inferior esquerdo, em que o tradicional dragão dourado se ressaltava.
            Da carruagem desceu um dos famosos encarregados, pessoas a quem a população temia, sabendo que, quando apareciam, era quase certo que seria para anunciar algo nada bom – alistamento forçado, aumento de impostos, confisco de propriedades e recursos, entre outros. Seu nome era Leif: velho, baixo, quase totalmente careca e com bigode e uma reminiscência de cabelos brancos, trajava a roupa típica dos encarregados – um uniforme de oficial de exército vermelho, com diversos distintivos e honras, além de calça preta presa em botas, também pretas.
            - Bom dia, senhor Brodden. – falou em seu tom sempre afável e calmo Leif.
            -Bom dia, senhor Leif. O que traria a vossa presença para essa humilde fazenda?
            - Como o senhor bem deve saber, estamos no meio de uma guerra. E precisamos de “doações”. – falou o encarregado, frisando a palavra “doações”.
            - Com todo o respeito ao senhor e à Coroa, devo lembrar-lhe que a guerra que enfrentamos contra a Vernânia não é do meu interesse. Foi algo feito pelo rei, e pelos interesses do rei.
            - Isso não é verdade, senhor Brodden! Os interesses do nosso divino rei são os interesses de toda nossa nação! É ele quem protege nossas terras dos infames estrangeiros e dos desordeiros que residem em nosso próprio país! – explanou Leif em um tom mais energético, embora ainda afável.
            - Então, sendo inevitável conversar sobre esse assunto, o senhor não gostaria de tomar uma xícara de café em minha casa?
            - É uma oferta irresistível senhor Brodden. Irresistível!

            Dentro da casa do fazendeiro Brodden, tudo era calmo, tanto a casa quanto a maioria dos móveis dentro dela eram de madeira. Sentados à mesa (adivinhe...) de madeira, o plantador de trigo gritou:
            - Carla, por favor, traga um café para mim e para o senhor encarregado.
            - Pode me chamar só de Mark, não há necessidade para demasiada formalidade. – falou sorrindo Leif.
            - Qual é a quantia que a Coroa deseja de nossa plantação?
            - Um pouco súbito... Bem senhor... – Mark foi interrompido por Carla trazendo café – Que rapidez. Muito obrigado senhorita. Continuando nosso assunto, imagino que 40% da colheita seria quantia suficiente.
            - Quarenta?! Que absurdo! Senhor Leif, entendo que nosso país esteja em guerra contra a Vernânia, e entendendo o quão difícil deve estar sendo para o Rei lutar contra esses desgraçados, mas necessito da minha colheita para pagar os gastos da minha família! Meu filho mora em Rine, e pagar suas despesas não é fácil com uma safra terrível e tendo que pagar impostos exorbitantes.
            - Eu sinto lhe informar que o pagamento dos impostos à Coroa não é algo negociável. O rei Frederick IX necessita urgentemente de dinheiro, para poder pagar seu exército.  Ele é formado por pessoas de todo o Trevaso[1], pessoas que jamais lutariam por nós sem que nós déssemos algo em troca, e por isso necessitamos de dinheiro, dinheiro para soldados, soldados para lutarem pela nossa independência, e pela nossa nação.
            - Vamos passar então o tributo de 23% para 30%. É o máximo que posso pagar, senhor Leif.
            - Não adianta fazer tais pedidos, não se discute com a Coroa. A vontade do rei é a vontade divina e a vontade da nação. Nem mesmo eu tenho poder para fazer concessões. O senhor terá de pagar os 40%, como o governo determinou. – falou Mark Leif terminando a xícara de café. – e o senhor sabe o que ocorre com os quais não pagam o que é devido ao nosso líder, não sabe?
            Um clima incômodo se estabeleceu. Leif arrependeu-se do modo que falou, e tentou consertar:
            - Não encare minhas palavras como uma vil ameaça, só digo a verdade, e o senhor bem sabe disso. Nada posso fazer na tentativa de negar ordens superiores. Sinto muito, senhor Brodden, mas devo sair de sua confortável casa e da amigável companhia da vossa senhoria e de vossa amável esposa. – virando-se para Carla, completou – Saboroso café, senhorita Carla. Agradeço muito. Se vocês me dão licença, preciso falar com mais alguns produtores da região, sinto muito em não poder ficar mais nem poder ajudar os senhores. Acredite, senhor Brodden, não sou eu quem dá as ordens, eu apenas as cumpro.


[1] Trevaso é o continente do qual tanto Vernânia quanto Terra per Timorem fazem parte.

I



            Gustavo olhava a cidade pela sua janela, obsevando toda a movimentação que ocorria. Feirantes guardando seus produtos. Mulheres apressadas fazendo compras. Homens andando nervosamente pelas estreitas ruas. Soldados polindo espadas e lanças, pegando seus escudos, preparando canhões e colubrinas.
            Gustavo fora eleito rei dessa nova e rebelde nação. E sabia que tempos difíceis estavam por vir. Abatis estavam sendo montados em cada rua e ele sentia-se como um não merecedor do título que recebera: o principal motivo pelo qual fora eleito rei fora sua importante partição e incentivo para que a revolução acontecesse. Agora, ela estava em andamento, e ele se sentia impotente diante de suas proporções.
            Tudo ocorrera de forma tão rápida, tão súbita...